GUANAMBI, BAHIA E BRASIL: DITADURA NUNCA MAIS!
Os meninos do CEG no Congresso de Reconstrução da UNE em Salvador - 1979. |
DESBRAVANDO
A HISTÓRIA
Por
José Carlos Lélis Costa (Latinha)
Todo processo histórico e dialético,
uma geração influência a outra, transmitindo os seus sentimentos e suas ideias.
A geração que antecedeu aos meninos do CEG – Centro Estudantil de Guanambi, de
uma forma direta influenciou no surgimento desse movimento. Uma lacuna
permanece e deve ser desvendada. A geração de Lúcia Teixeira, João Rocha, Dr.
Marlindo, Gigiu, Avelar Viana, Isa Lélis e outros estudantes que se deslocaram
para estudar em Salvador, no período do regime militar, tiveram uma importante
contribuição na formação democrática e libertária da nova geração que estava
por vir e souberam resistir ao golpe contra a liberdade.
Na gestão de Dr. José Humberto Nunes
está turma organizaram um jornal de protesto contra o regime e nas madrugadas
negras do regime distribuíam panfleto conclamando o povo a vota contra o
candidato único a prefeito da cidade, pois neste período não existia em
Guanambi o candidato da oposição.
Outro aspecto que precisa ser
resgatado foi sobre a geração que vivia nos subterrâneos e nas prisões no
regime militar, tais como: Haroldo Lima, Manezinho, Zé Novais, entre outros. Outros
movimentos de resistência tinham simpatizantes em Guanambi, a exemplo do Grupo
dos Onze (Brizolistas).
O MDB engajou firme na luta de
resistência na cidade, contando com a lucidez e a força do Senhor Ciro Moraes e
de vários companheiros (Tiãozinho da Farmácia, Caetano, Eduardo. Sr. Jair, entre
outros militantes.).
Um mistério precisa ser desvendado – a
morte repentina de Lúcia Teixeira, membro na clandestinidade da direção
estadual do PCdoB da Bahia. A verdade nunca será sepultada e um dia virá à tona.
As informações que tivemos é que Lúcia Teixeira iria participar da Guerrilha do
Araguaia, sendo que foi presa pelo militares da Bahia e por motivo de saúde foi
internada e repentinamente veio a falecer, misteriosamente.
Com
o objetivo de resgatar, os fatos que antecederam o golpe de 64 e os episódios
que marcaram a nossa época de lutas e resistências, publicamos o filme que
acompanha a nossa geração, servindo como espelho para as novas gerações que
precisam acreditar nas mudanças necessárias que o país tanto reclama.
CENTRO
ESTUDANTIL DE GUANAMBI – CEG
Contexto
histórico
Nos anos terríveis da ditadura Médici
ocorrerá a Guerrilha do Araguaia, na qual tombaram vários guerrilheiros da
Bahia. Muitos sofreram prisões e torturas. Em 1974, Médici transfere o cargo
para o novo ditador de plantão, Ernesto Geisel, que promoveu uma abertura do
regime, de forma lenta, gradual e segura.São ainda anos duros do regime
militar.
Um novo clima vai surgindo no país,
independente da ditadura. O movimento estudantil volta a procurar espaços para
atuar. A esquerda volta a disputar os diretórios acadêmicos e procura, aos
poucos, reconstruir os DCEs que tinham sido destruídos. Ocorrem greves
estudantis na Bahia e em
São Paulo. Os estudantes realizam o I ENE – Encontro Nacional
de Estudantes, em São
Paulo. Os autênticos do MDB se agrupam e passam a lutarem
contra os adesistas do Partido, defendendo anistia ampla; revogação das leis de
exceção e o fim da censura; liberdades democráticas.
A Bahia era governada por ACM,
governador biônico. À frente da prefeitura de Guanambi estava Jonas Rodrigues
da Silva, eleito em 1973, pela ARENA.
O ensino superior estava concentrado em Salvador. Havia um
anseio dos estudantes em deslocar para a capital e continuar os seus estudos.
Em 1975, surge o CEG
O
Surgimento do CEG
Desde
1974, os estudantes guanambienses pensavam na criação de uma entidade que os
organizasse. Em 25 de maio de 1975, na sede do DCE da UFBa, na Rua Carlos
Gomes, após algumas reuniões preparatórias, estudantes de Guanambi que já moravam
em Salvador, aprovam os estatutos e criaram o CEG. Sua principal finalidade era
lutar para que fosse criada a Residência dos Estudantes de Guanambi em Salvador. Já existiam
a Casa dos Estudantes de Feira de Santana (pioneira), Casa dos Estudantes de Itabuna
e a Residência dos Estudantes de Conquista (REC). Esses estudantes de Guanambi,
no período das férias, iniciaram a atuação da entidade na cidade e levantaram a
bandeira da criação da REG.
O
movimento ganha corpo e se organiza, realizando os primeiros movimentos
culturais e de lazer. As famosas barracas entre os bancos e na proximidade da
rua do sobe e desce (Rua 2 de julho) e na praça do Fórum era sucesso no recesso
escolar. Em fevereiro de 1976, ocorreu o I Encontro Cultural de Guanambi,
realizado pelo CEG na sede da Associação Guanambiense de Cultural e Assistência
Social, na Praça da Igreja. Foi uma semana de extensa programação cultural com
teatro, música, exposições de poesias, pinturas e fotografias; palestras,
recitais de poesia e debates; apresentação do grupo de teatro de Salvador-
Amador Amadeu, etc. Realizamos mais dois encontros culturais em 1977 e 1978, no
Clube da Rua de Dona Dedé. O movimento ganha apoio da sociedade.
O
CEG realiza campanha de cunho social, luta para transformar o Centro Cívico Major
Cosme de Farias em grêmio livre no Colégio Estadual Governador Luiz Viana Filho,
reorganiza o São João tradicional da cidade, realiza assembléias e reuniões com
o objetivo de conquistar a compra da REG. Em 1986, foi criado o Grêmio Cultural
Jorge Amado.
O CEG engaja firme no movimento
estudantil e no processo de retomada das lutas em defesa das liberdades
democráticas, passando a atuar nos embates contra a ditadura militar e
auxiliando na reorganização das entidades e movimentos em geral (CIVUB, UNE,
UBES, UEB, DCEs, Grêmios, DAs, Movimento Contra a Carestia, Movimento da
Anistia).
A interferência no movimento político
da cidade, através do MDB, cresceu no mesmo ritmo que cresceu a pressão das
oligarquias da cidade. A repressão e as espionagens como acontecer no trabalho
do CEG em Guanambi e em Salvador.
No início nos chamávamos de cachaceiros,
depois começam as provocações: “MDB e CEG são comunistas – vote ARENA”. Os
murros da cidade amanheciam todos pichados contra o nosso movimento. Em 1976,
promovemos as primeiras audiências e reuniões reivindicando do prefeito
municipal a criação da REG, contando como um amplo apoio da CIVUB e da
comunidade da cidade.
Em pleno regime militar, quando era
proibido fazer passeatas, mobilizamos o povo, através do teatro de rua e
realizamos uma grande concentração que reuniram mais de 5000 pessoas reivindicando
a REG. Manezinho e Zé Novais ,
dirigentes do PCdoB, assistem clandestinamente, a agitação e a movimentação dos
estudantes em Guanambi. O
presidente da CIVUB, Luiz Nova, presta importante solidariedade e apoio
estadual ao movimento.
Enfim conquista o aluguel da casa dos
estudantes em Salvador – A REG nasce com toda força.
A
REG E A CIVUB
Com a criação da REG, ampliou-se o
engajamento do CEG no movimento estudantil e popular da Bahia. Em Salvador,
onde surgia um foco de resistência ao regime militar, tinha uma liderança de
Guanambi na frente da batalha. O CEG e a REG participaram ativamente da
articulação e da fundação da CIVUB (Confederação Interiorana de Vestibulandos e
Universitários da Bahia), entidade que organizou as residências do interior na
capital e que posteriormente foi o fórum de reorganização das entidades
estudantis da Bahia e do Brasil (UNE, UBES, UEB, Das, DCEs).
A CIVUB coordenou as lutas conjuntas
das casas dos estudantes por melhores condições de moradia e estudo e na defesa
das mesmas, contra os prefeitos que vinculados ao poder estadual, queriam
fecha-las por que representavam a resistência contra as oligarquias locais e
como centro de conscientização das populações interioranas.
O CEG, a REG e a CIVUB participaram
ativamente para a realização do glorioso congresso de reconstrução da União
Nacional dos Estudantes (UNE) em Salvador, em 1979. Em pleno congresso da UNE,
as lideranças de Guanambi e da CIVUB jogaram papel fundamental nos primeiros
passos para a reorganização da UBES (União Brasileira de Estudantes
Secundaristas).
Tudo isso ocorria num clima de lutas
políticas e de ideias entre as diversas correntes do movimento estudantil – VIRAÇÃO
(PCdoB), Nova Ação (AP), Liberdade e Luta (Libelu), Hora do Povo (MR-8), etc.
No nosso movimento sempre houve um respeito e uma convivência democrática, onde
todos respeitavam as diferenças ideológicas do período, garantindo assim na
prática a liberdade de expressão que tanto defendíamos.
A REG transformou-se num importante centro de
cultura, política e de lazer da capital, buscando novas formas de intervenção
no movimento social, através de peças teatrais, formação de um grupo de forró,
que promovia os arrasta-pés mais animados de Salvador. Passou também a ser uma
referência nacional das caravanas de estudantes de todo o país no período do
recesso escolar. Um centro de solidariedade para os enfermos de Guanambi. Acima
de tudo, a residência cumpriu como o seu principal papel que era a formação
profissional de diversos estudantes carentes da cidade.
O CEG plantou a semente do amanhã,
enquanto a REG regou com muita luta, suor e perseverança os frutos que foram
colhidos pela comunidade de Guanambi. São diversos profissionais liberais que
prestam enormes serviços nos dias de hoje na cidade ou estão espalhados pela
Bahia e o Brasil.
Não podemos deixar que as novas
gerações se percam nas desilusões políticas impostas pelas classes dominantes.
A história mostrou que os meninos do CEG estavam certos. Hoje,
independentemente da ideologia dos vários segmentos da população da cidade, os
atores desse filme são respeitados e servem de referência para a nossa
juventude.
Ficha do SNI - Serviço Nacional de Informação contra os meninos do CEG.
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