Ana Prestes: Estamos fazendo a revolução do diálogo em Contagem
Portal Vermelho
O diálogo e a construção coletiva de políticas públicas educacionais têm sido algumas das principais marcas da Secretaria de Educação de Contagem, localizada a 15 km de BH. Com uma rede pública composta por cerca de 60 mil alunos, 81 escolas de ensino fundamental e 26 de educação infantil e mais cinco mil profissionais, Contagem enfrenta o desafio de envolver diversos segmentos da sociedade – alunos, professores e pais – para consolidar um novo conceito de construção cidadã na educação.
Os primeiros passos rumo a essa inovadora concepção educacional na cidade começaram na gestão do atual prefeito Carlin Moura (PCdoB-MG), eleito em outubro de 2012 com o apoio de mais 65% da população. Em entrevista à jornalista Mariana Viel, do Portal Vermelho, a secretária municipal de Educação, Ana Maria Prestes Rabelo, falou sobre as metas, os desafios e os projetos educacionais de Contagem para os próximos anos.
A cientista social, mestre e doutora em ciência política pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), explica que a relação da administração municipal e demais partes do sistema educacional era uma carência da cidade. “Temos demonstrado ao longo desses primeiros meses uma maior abertura para o diálogo e a construção das políticas de forma coletiva. Acabamos de ter uma campanha salarial forte por parte dos trabalhadores, inclusive com indicativo de greve em alguns momentos, e conseguimos fazer com que o diálogo prevalecesse. Abrimos uma câmara setorial com os trabalhadores e dirigentes, e temos nos reunidos frequentemente com eles. Acho que uma das marcas da nossa gestão é o diálogo. Já falamos em alguns momentos que viemos fazer a revolução do diálogo, da colaboração e da construção coletiva. Não é fácil. Obviamente existem muitas diferenças de concepção, mas acho que nossa grande marca tem sido a construção coletiva do diálogo de uma forma serena, mas contundente aos propósitos que pactuamos desde o início do ano”.
O forte apoio popular ao prefeito Carlin é apontado pela secretária municipal como um dos fatores mais significativos desse diálogo. “A figura dele é muito carismática e as pessoas têm muito carinho, muita expectativa, esperança e confiança. Percebemos em todos os bairros, regiões, e escolas da cidade que visitamos que as pessoas têm muito carinho pela figura dele, que é uma pessoa de fácil acesso e de diálogo”.
Uma das ferramentas encontradas pela Secretaria de Educação para se aproximar da comunidade escolar e de suas diferentes realidades foi a criação do formato de gabinete itinerante. Como a cidade é divida em sete regiões, são realizadas visitas periódicas semanalmente nas escolas, onde a secretária recebe as maiores demandas de pais, diretores e professores.
“Quando vou às escolas faço questão de perguntar, desde as crianças até os diretores, como está a merenda e todos os outros diversos aspectos da escola — para que todos tenham voz e participação. Acho que temos tido muito sucesso nesse sentido”.
Primeiros passos
A primeira missão da Secretaria de Educação foi colocar todo o sistema em funcionamento e preparar a rede para o início do ano letivo. Todo este processo incluiu a montagem do quadro de pessoal, limpeza e reforma das escolas e preparação dos equipamentos e materiais. “Como temos uma rede muito grande esse é um trabalho considerável. Avalio que estamos no começo da gestão e ainda temos feito vários ajustes à nossa realidade atual, principalmente, no que diz respeito à reforma estrutural das escolas já que muitas estavam em situação precária. No quadro de pessoal ainda temos que repor muitos profissionais para que tudo esteja em um funcionamento considerado ao menos razoável”.
Assim como em todo o país, figura entre os graves problemas enfrentados na gestão da área educacional da cidade a saúde dos professores, a valorização e a formação continuada. Ana Maria relata a necessidade da formatação de uma eficiente política de substituição para que os alunos não sejam prejudicados.
“Esse é problema que percebemos ser generalizado na Educação no país e que tem muita relação com a valorização do profissional e a atenção à saúde desse profissional que tem condições específicas e uma realidade diferenciada de trabalho. Muitos lidam com uma população vulnerável do ponto de vista social e com muitas fragilidades em relação à saúde, à moradia e ao sistema básico de saneamento. Isso também afeta o público que vai à escola. Quando o aluno vai para a escola, vai toda a família e toda a condição na qual ele está vivendo. Nosso profissional da Educação é extremamente exigido desse ponto de vista, o que exige uma atenção muito especial. A formação continuada de nossos profissionais também é uma de nossas prioridades”.
Universalização da educação
As diretivas da administração municipal rumo à consolidação de políticas permanentes colocam como prioridade a atenção à educação infantil, no que diz respeito à conclusão das obras em alguns Centros Municipais de Educação Infantil (Cemeis) — que atende crianças de zero a cinco anos de idade. Para sanar a grande demanda por vagas da educação infantil até o final deste ano Contagem contará com quatro novos Cemeis.
Outros pontos são a valorização dos profissionais da educação infantil que ainda têm salários e qualificação diferenciados e a qualidade do material literário para as crianças da pré-escola que vão seguir para o primeiro ano do ensino fundamental.
“Temos o desejo de universalizar o acesso das crianças de quatro anos até 2016, para que toda a criança nessa faixa etária no município tenha o direito a uma vaga na escola pública. Hoje nós ainda não temos essa capacidade de absorção e estamos preparando a rede para a universalização”.
Da educação infantil ao ensino fundamental, a Secretaria de Educação tem voltado atenção especial na elevação da qualidade do ensino. Até o final de 2014 também serão inauguradas duas escolas de ensino fundamental em regiões que contam com programas habitacionais. Neste processo, um dos desafios são os anos finais do ensino fundamental – que possui as maiores taxas de evasão, de adoecimento de profissionais e os menores índices de frequência e do Ideb [Índice de Desenvolvimento da Educação Básica].
“Isso é muito ruim para uma rede municipal porque se o objeto do ensino fundamental é fazer com que a formação seja plena, e que eles possam ir bem preparados para o ensino médio, eles têm que ter qualidade. O professor tem que ter prazer de ensinar, de ir ao trabalho. Queremos que os nossos meninos, que são o nosso produto final, saiam realmente preparados para um mundo competitivo, para fazer bem o ensino médio — visando a formação universitária. Estamos com o olhar mais sensível nessas duas pontas: o comecinho, que é quando eles estão entrando na educação infantil e no final, que é quando eles estão saindo do ensino fundamental. Se conseguirmos elevar a qualidade nessas duas pontas teremos feito bastante pelo município”.
Programas federais
Com um orçamento anual estimado em cerca de R$ 400 milhões, a secretária de Educação vê como estratégicas as parcerias com o governo federal, em especial com os Ministérios da Educação e do Esporte. “Percebi quando assumi a Secretaria de Educação que precisamos realmente dos 10% do PIB e de parte dos recursos do pré-sal para a Educação. Precisamos de um Plano Nacional de Educação, que está se arrastando no Congresso Nacional. Também estamos bastante empenhados em Contagem na construção da Conae (Conferência Nacional de Educação). O que percebi com muita força é que ainda falta muito recurso para que a Educação tenha uma maior qualidade”.
Através do programa Mais Educação – que aumenta a oferta educativa nas escolas públicas por meio de atividades agrupadas em macrocampos como acompanhamento pedagógico, meio ambiente, esporte e lazer, direitos humanos, cultura e artes, cultura digital, prevenção e promoção da saúde, educomunicação, educação científica e educação econômica –, a Secretaria de Educação disponibiliza opções para os alunos da rede durante o contra turno escolar. “A maioria das nossas políticas para a Educação ocorrem em parceria com o MEC. O diálogo com o governo federal nos ajuda muito na construção de novas unidades escolares e na incorporação desses programas ao cotidiano da escola. Felizmente, quase todas as escolas da nossa rede têm quadras e vestiários e temos nos empenhado, inclusive junto ao Ministério do Esporte, para que chegue material esportivo adequado. Estamos agora aderindo também ao Programa Atleta na Escola”.
Além de oferecem novas oportunidades de lazer, esporte e educação, as parcerias com o governo federal são importantes instrumentos na luta contra as drogas e a violência nas escolas e em seu entorno. Contagem é hoje a cidade mais violenta do estado de Minas de Gerais, o que exige um trabalho cotidiano de reforço com os diretores de escolas que muitas vezes se sentem fragilizados e ameaçados.
“Temos uma parceria muito grande com a Guarda Municipal e estamos também reforçando o nosso trabalho de segurança comunitária — através dos conselhos de segurança comunitária nos bairros. Tentamos integrar ao máximo as escolas à comunidade para que ela se aproprie daquele espaço e para que ele passe a fazer parte do cotidiano da sociedade. É um problema extremamente complexo e que muitas vezes escapa ao que a Educação pode fazer e dependemos da integração com outras secretarias e frentes”.
Formação cidadã
Mãe de Helena, de sete anos, e de Gabriela, de apenas três anos, a secretária de Educação reafirma total confiança na educação oferecida para a filha mais velha, aluna do 2º ano do ensino fundamental da rede pública de Contagem. “Confio plenamente na educação e em tudo que ela está vivenciando na escola pública. Ela está estudando em escola com profissionais muito competentes, com uma boa infraestrutura, um conselho escolar ativo, e que tem a participação da família. Não me preocupo somente com o que ela terá de conteúdo na sala de aula, mas se ela está vivendo a escola como um processo democrático de formação. Para mim, a escola não está apenas no conteúdo que ela vai ter no livro e na avaliação, mas no conjunto que traz uma formação de cidadania. Isso vai trazer para ela, do ponto de vista da formação como um ser humano, algo que outra forma de educação não daria”.
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