FACHIN, O SALVADOR DE MORO E DA LAVA-JATO



João Batista de Castro Júnior

Professor Adjunto do Curso de Direito da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB), campus Vitória da Conquista. 


Nos últimos dias, sequências factuais envolvendo o despudor da Lava-Jato tornaram cada vez mais iminente a ruína do castelo de cartas de Curitiba, com providências inclusive criminais sendo sinalizadas no horizonte do órgão de cúpula do Judiciário contra a trupe inquisitorial de Sérgio Moro. Até a imprensa liberal estrangeira começou a denunciar os furos do lava-jatismo, abandonando-o como a um barco sem salvação.

Bem analisadas as coisas, a decisão de Fachin é um bem engenhado expediente, um freio de arrumação no acelerado desgaste da imagem institucional do aparelho de justiça. Não há novidade nisso nem dentro nem fora do Judiciário. Basta lembrar que, nos últimos meses, desde ministros do STF e do STJ até membros do MP em 1º grau defenderam uma ignominiosa prioridade na vacinação, em franco, ilegal e frio desrespeito a um dos momentos de maior miserabilidade econômica emocional do País. Ajeitaram-se as coisas carbonizando-se um mero diretor subalterno da presidência da Corte Suprema.

Mais recentemente, esse grau de fria indiferença das instituições do aparelho de justiça para com o entorno social foi ao limite quando  procuradores do MPF, mesmo ganhando pelo teto salarial do funcionalismo brasileiro, foram flagrados rejeitando como esmola celulares de R$ 3.600 reais com o dinheiro do contribuinte.

Bem protegidos pela fachada popular de combate à corrupção associada ao MPF, os procuradores não serão certamente incomodados por qualquer ameaça disciplinar, afinal, nem casos de aparente maior gravidade se transformaram em punição, a exemplo do caso envolvendo o procurador da Lava-Jato Januário Paludo, ídolo dos colegas de Curitiba, secretamente absolvido do suposto recebimento de propinas do doleiro dos doleiros, sem que até hoje se saiba quais as razões que levaram o Conselho Nacional do Ministério Público a essa decisão, já que, quaisquer que sejam elas, certas ou não, não são publicizáveis mesmo havendo interesse público, o mesmo interesse que Moro e seus procuradores sempre antepuseram como um belo escudo discursivo em defesa da moralidade constitucional para praticar suas atrocidades.

O reconhecimento da suspeição de Moro, porém, seria capaz de um estrago muito maior que esses vergonhosos e habituais episódios de agentes do sistema nacional de justiça do Brasil. Fachin, então, sentindo o perigo do galope antilavajatista, deu um tiro de morte na condenação do ex-Presidente, algo que, na prática, pode ter efeito similar à morte encomendada do assassino de Kennedy ou, se se quiser um exemplo de morte ficcional, segundo se diz, ao controverso desaparecimento do filho do então ministro do Supremo, Alfredo Buzaid, durante a Ditadura Militar, quando o clamor popular contra o crime  e qualidade da prova policial faziam o processo caminhar para a condenação.

Na técnica jurídica, isso se chama perda superveniente do interesse processual, conhecida também como perda de objeto, ou seja, asfixia-se completamente o impulso processual porque o alvo deixou de existir. Os romanos cunharam a esse respeito uma expressão bem conhecida nos domínios teóricos do Direito: “mors omnia solvit”, ou seja, “a morte tudo resolve”. Resolve até por conveniência.

Está-se, assim, tentando abortar a criminosa suspeição de Sérgio Moro, no âmbito da qual se tornaria ainda mais escancarada a pretendida e petulante imunidade institucional de membros da Lava-Jato, que, no auge do seu esplendor midiático, além de executar a destruição de reputações com culpas forjadas, chegaram ao acinte de orquestrar secretamente até queda de ministros da Suprema Corte, para não falar do desplante de defender a formação de uma cidadela institucional com dinheiro dos Estados Unidos, entre outras barbaridades que fazem da invasão do Capitólio um café pequeno.

É bem verdade que, na boa técnica processual, não necessariamente o reconhecimento da incompetência jurisdicional de Curitiba implica que o STF deva abdicar de apreciar a suspeição de Moro. Resta saber se a Suprema Corte vai se sentir com fôlego para ir adiante, sobretudo porque, além de alvo dos brucutus bolsonaristas, entraria também na alça de mira da ala morista do Judiciário e do Ministério Público, de políticos, militares e de rentistas.

A decisão de Edson Fachin, com muito boa vontade, pode ser enquadrada como "justiça, ainda que tardia". É claro que é politicamente útil ao ex-Presidente. Mas o Lula finalmente livre de Curitiba nesse ato decisório do ministro do STF é só e tão somente um “vão-se os anéis, fiquem os dedos”.  

Vitória da Conquista, Bahia, 8 de março de 2.021, 18h30min. 

 

 


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