Movimento Vida SIM, Barragem Não!: CARTA ABERTA ÀS AUTORIDADES E A TODA POPULAÇÃO DO ALTO SERTÃO BAIANO

  

Diante dos recentes históricos com grande número de mortes decorrentes do rompimento de barragens, bem como da iminente e nefasta instalação da Barragem de Rejeitos da Mina Pedra de Ferro, pela empresa Bahia Mineração (BAMIN) em nossa região, NÓS, integrantes da sociedade civil organizada conclamamos todas as autoridades responsáveis, direta e indiretamente, para que possam impedir a instalação dessa barragem nos moldes impostos pela empresa responsável. 

Como é sabido por muitos, ainda que tenham havido relatórios de impactos ambientais, planos de contingenciamento realizados, tarefas obrigatórias de treinos para evacuamento de pessoas das cidades e lugarejos, os últimos acontecimentos de Mariana (2015) e Brumadinho (2019) deixaram juntos mais de 260 mortes confirmadas.  

Há quase quatro anos, no dia 5 de novembro de 2015, o rompimento da Barragem de Fundão, da Mineradora Samarco, deixou 19 mortos e causou uma enxurrada de lama que inundou várias casas no distrito de Bento Rodrigues, em Minas Gerais, causando mortandade de toda a cadeia da fauna do rio Doce e do ecossistema como um todo. Os prejuízos materiais e sociais são irrecuperáveis. As perdas atingiram, de modo irremediável, o geossistema e, principalmente, a vida dos moradores. Segundo Tiago Félix, biólogo e educador ambiental da Fundação SOS Mata Atlântica, o rio Doce demorará “muito mais” que 100 anos para ser restaurado; mas, mesmo com tão remota expectativa, não se pode confirmar sua recuperação.  

De modo mais devastador, outra tragédia aconteceu no dia 25 de janeiro deste ano. A Barragem de Córrego do Feijão, em Brumadinho - Minas Gerais, de propriedade da mineradora Vale, se rompeu, provocando uma onda de rejeitos que destruiu casas, plantações e contaminou parte do Rio Paraopeba, afluente do São Francisco. Até o momento, há 244 mortes confirmadas e, de acordo com a Defesa Civil do estado, passados quase quatro meses após tragédia da Vale, ainda há 26 pessoas desaparecidas (dados da Defesa Civil de MG em 31/05/2019). Como consequências desse crime, os danos são incontáveis; desde a desterritorialização das populações indígenas com perda de sua cultura local, mortes da fauna e flora, prejuízos que ecoam no apagamento da rede hoteleira, antes fonte de trabalho para os moradores locais, até e, principalmente, as mais de centenas de vidas ceifadas abruptamente. 

Considerando essa magnitude de perdas materiais, humanas e de todo um ecossistema, a instalação de uma Barragem de Rejeitos na nossa região pode trazer danos ainda maiores, uma vez que o local escolhido para sua alocação se encontra acima da Barragem de Ceraíma, nosso principal reservatório de água potável, do qual sertanejos retiram seu sustento, sobretudo, através da agricultura familiar. 

Vale ressaltar que a escassez de água, inerente ao sertão, tende a ser agravada ainda mais, uma vez que a área destinada à construção da barragem de rejeitos Pedra de Ferro fica localizada entre os municípios de Caetité, Guanambi, Pindaí e distritos circunvizinhos, os quais possuem potencial hídrico que abarca a bacia do Rio das Rãs e, consequentemente, o Rio São Francisco. O Velho Chico, por sua vez, abastece TODAS as comunidades da região do Alto Sertão. Com a construção dessa barragem, a BAMIN poderá utilizar até 1.620 metros cúbicos de água por hora do rio1, água que deixará de abastecer os habitantes dos municípios supracitados.  

Além do uso indevido e exacerbado dos recursos hídricos, a empresa ainda alega desenvolvimento. Contudo, observa-se que o esse pressupõe a necessidade existencial de cinco pilares; são eles: a) o Social, fundamental, por motivos tanto intrínsecos quanto instrumentais, por causa da perspectiva de disrupção social que paira de forma ameaçadora sobre muitos lugares problemáticos do nosso planeta; b) o Ambiental, com as suas duas dimensões (os sistemas de sustentação da vida como provedores de recursos e como “recipientes” para a disposição de resíduos); c) o Territorial, relacionado à distribuição espacial dos recursos, das populações e das atividades; d) o Econômico, sendo a viabilidade econômica a conditio sine qua non para que as coisas aconteçam; e) a Política, pois a governança democrática é um valor fundador e um instrumento necessário para fazer as coisas acontecerem; a liberdade faz toda a diferença (SACHS, 2004, p. 15-16)2. Logo, a propositura da Barragem pela BAMIN não obedece e nem dialoga com os ditames sociais, ambientais, territoriais, econômicos e políticos.
                                                         
 1 AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS (ANA). Resolução nº 469, de 13 de setembro de 2010. Disponível em: <arquivos.ana.gov.br/resolucoes/2010/469-2010.pdf>. Acessado em 28 de mai. de 2019. 2 SACHS, Ignacy. Desenvolvimento: includente, sustentável, sustentado. Rio de Janeiro: Garamond, 2004. 

Há que se salientar que o envolvimento democrático da sociedade em projetos de grande impacto socioambiental é primordial e, em se tratando da instalação da Barragem de Rejeitos na área que abarca os municípios de Caetité, Guanambi e Pindaí, a opinião e a participação popular foram suprimidas, rompendo processos de democratização garantidos constitucionalmente e vistos como instrumentos necessários para assegurar o alargamento da democracia participativa. Assim, o processo de escolha das ações da empresa foi nivelado pela ausência ou escassez de possibilidades de participação cidadã, bem como de influência de estratégicos grupos nos processos decisórios. 

Diante disso, partindo do pressuposto que o hipotético desenvolvimento econômico não pode sobressair à defesa da dignidade humana e nem muito menos investir contra o direito à vida, solicitamos que as autoridades competentes tomem providências cabíveis e imediatas para que seja impedido o prosseguimento da alocação da Barragem de Rejeitos na parte alta da bacia hidrográfica do Rio das Rãs, sob pena de ocorrência de desastres iminentes e irreversíveis de ordem social, ambiental, territorial, econômica e antidemocrática, caracterizando assim uma tragédia anunciada com ceifamento de vidas humanas e não humanas.  

Além dessa solicitação às autoridades, convidamos também TODA a sociedade do Alto Sertão/Sertão Produtivo – comunidades circunvizinhas ao município de Guanambi - para que possamos nos unir no dia 06/06/2019, às 7h30min, na Praça da Igreja Matriz Santo Antônio, com o objetivo de lutarmos a favor da VIDA e contra a construção da barragem de rejeitos, mostrando nossa escolha por um desenvolvimento sustentável, priorizando sempre a dignidade humana, o direito à vida, a manutenção de um meio ambiente ecologicamente equilibrado e os ditames democráticos que devem ser observados por qualquer empreendimento econômico. 

Movimento Vida SIM, Barragem Não!
 Guanambi, 03 de junho de 2019.

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