POR QUE NÃO HAVERÁ RESISTÊNCIA À PRISÃO DE LULA


João Batista de Castro Júnior. Professor Doutor do Curso de Direito da Universidade do Estado da Bahia,  campus Brumado
A intensidade do que chamam deliberada opressão judiciária tem feito alguns mais afoitos defender resistência nas ruas contra eventual prisão de Lula por força de uma Operação Lava Jato que eles comparam àquele antigo delegado de polícia e seus agentes calças-curtas que espancavam o trabalhador estigmatizado com o clichê de vagabundo e baderneiro, em obediência servil à manipulação ideológica do latifundiário improdutivo, para receber, como moeda de troca por esses serviços, cumprimentos de falsa afabilidade social dos que detêm o poder.
Esse tipo de resistência muito improvavelmente acontecerá, já que pressuporia um  nível de participação popular inexistente historicamente por aqui.
Nem mesmo uma questão que afeta nossa soberania tem sido objeto de preocupação massiva e mais engajada. Trata-se da ausência de percepção geral de que, sendo a energia o bem por trás de toda transformação no universo, nossa gigantesca riqueza no setor vem sendo sistematicamente cobiçada e manipulada por potências cujas reservas foram progressivamente se exaurindo, enquanto a grande mídia continua fazer o brasileiro comum ingenuamente acreditar que falta pouco para o Brasil entrar no time do primeiro mundo.
Estarrecedor ver personalidades sem conexão ideológica ou político-partidária se esfalfarem gritando a esse respeito, enquanto gente com regular aparelhagem  acadêmica teima em achar que é mera teoria da conspiração cunhada por quem quer um governo comunista em que o grupo dirigente se esbalda nas regalias enquanto milhões morrem de inanição, como se viu algumas vezes na história.
Assim é que, só para ficar em alguns poucos, podem-se citar vários nomes que emitem alertas sobre a conspiração externa contra nossa autonomia na produção e gerenciamento energéticos: o notável baiano Bautista Vidal, físico e professor da UnB, falecido em 2013, que foi secretário de tecnologia dos Governos Ernesto Geisel e José Sarney, criador do motor a álcool; Roberto Requião, senador pelo PMDB; Leonardo Boff, filósofo, um dos pais da Teologia da Libertação; Enéas Carneiro, médico e fundador do PRONA, além do historiador Moniz Bandeira e do insuspeito norte-americano Noam Chomsky, matemático e linguista crítico do imperialismo ianque.
A cosmovisão popular no geral e as lentes jurídicas têm um ponto em comum nesse enredo: ambas são míopes, de reduzido alcance.  A formação jurídica, como tantas vezes dito, tem estado abaixo da linha do sofrível no quesito compreensão social e política. Não admira que grandes questões nacionais, que envolvem até inquietações epidemiológicas, adormecem, quando judicializadas, nas prateleiras dos cartórios. 
Há pessoas intelectualmente categorizadas que afirmam enquadrar como exemplo disso o que chamam de histeria condenatória da Lava Jato judiciária contra o engenheiro nuclear e almirante Othon Luiz Pinheiro da Silva, de 78 anos, sem dúvida uma referência científica de quilate mundial, um dos grandes responsáveis pelo desenvolvimento da tecnologia de enriquecimento de urânio através da chamada ultracentrifugação. Segundo ele próprio, os procuradores do MPF, em completa indigência intelectual sobre o assunto e incapazes de entender um mínimo detalhe técnico do que expôs sobre sua atuação científica e a remuneração que por ela recebeu, teriam chegado a menosprezar um desses seus estudos, como se fosse dado fazê-lo a meros portadores de regras mnemônicas de conhecimento jurídico.
Se verdadeiro, não é então inadequada a analogia com o antigo delegado de polícia calças-curtas que batia e mesmo matava os que lhe eram vendidos como terroristas comunistas, tal como foi feito a João Leonardo da Silva Rocha, militante de esquerda, que, com o sequestro do embaixador norte-americano Charles Elbrick, em 1969, foi enviado para o México, de onde retornou em 1971, asilando-se em Palmas de Monte Alto, aqui na Bahia, onde foi cravejado de balas por esbirros policiais ordenados pela ditadura militar e sepultado sob os olhares de montealtenses informados de que se tratava de perigoso pistoleiro.
Curiosamente, décadas depois, o Ministério Público Federal, que me dirigiu convite para participar do evento ano passado, encabeça cerimônia de resgate da verdade histórica. Que isso não seja um mau presságio metafórico da morte de nossas esperanças geopolíticas daqui a alguns anos...
Brumado, Bahia, 28 de janeiro de 2018. 


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