NORDESTE: ALGODÃO AGROECOLÓGICO NA AGRICULTURA SOLIDÁRIA


O especialista técnico e representante da Organização Não Governamental Esplar, Pedro Jorge Lima, que trabalha a serviço do fortalecimento da agricultura familiar há 32 anos, aponta o cultivo do algodão orgânico e agroecológico no Brasil como uma interessante alternativa para a agricultura solidária.

Ceará: 64% da produção de algodão agroecológico Os bons tempos surgem com o interesse de indústrias na produção de têxteis orgânicos, principalmente os que empregam o algodão orgânico e agroecológico como matéria-prima. A demanda de procura é maior que a de oferta do produto.

Numa pesquisa que realizou juntamente com a pesquisadora do Instituto de Economia Agrícola (IEA), da Secretaria de Agricultura e Abastecimento de São Paulo, doutora Maria Célia de Souza, o pesquisador do Esplar destaca que entre 2001 e 2005 o número de marcas e varejistas que ofereceram produtos de algodão orgânico cresceu exponencialmente na Europa, Japão e América do Norte. O novo mercado produtivo, ecologicamente correto atraiu o interesse de multinacionais como a Nike e a C&A.

Neste período, as vendas passaram de US$ 245 milhões para US$ 583 milhões. A taxa média anual de crescimento foi de 35%. Enquanto isso, a demanda pela fibra de algodão orgânico aumentou de 5,7 mil toneladas, em 2000, para 32,3 mil em 2005. A média anual de crescimento foi de 93%. Os dados foram apresentados pela Organic Exchange, uma ONG norte-americana que vem se dedicando a incrementar a produção de fibra orgânica em todo o mundo.

O Brasil conta com uma experiência de quase 15 anos na produção, processamento e comercialização do algodão ecológico. O Ceará foi o pioneiro desse processo no País. A experiência teve início no município de Tauá. Até o ano passado, o Ceará representava 64 % da produção nacional com uma área de 218 hectares de plantio e colheita de 20t de algodão agroecológico em rama.

O Estado é o único caso em que a organização de agricultores familiares possui descaroçadeira própria, de pequeno porte. Por isso consegue vender o algodão em pluma por preços mais elevados para duas cadeias do comércio justo. Uma delas foi estabelecida pela empresa francesa Veja Fair Trade e a outra pela Rede da Justa Trama, da qual faz parte a ADEC, uma associação de sindicatos de trabalhadores rurais de Quixadá, Choró e Massapê.

De acordo com a explicação feita pelo engenheiro agrônomo e pesquisador da ONG Esplar, Pedro Jorge Lima, considera-se algodão orgânico aquele que é auditado e certificado por um organismo credenciado como certificador de produtos orgânicos. Já o algodão agroecológico trata-se daquele que é cultivado de acordo com as práticas da agroecologia, ou seja, preenche os todos requisitos para a certificação orgânica. No entanto, não é certificado como tal, seja por falta de recursos dos agricultores para arcar com os custos da certificação ou, ainda, porque o comprador da fibra dispensa o certificado.

"Seu" José Wilson está feliz com o retorno à atividade

Até arriscar no retorno ao cultivo do algodão, o lavrador José Wilson de Sousa pensou muito. Ele guarda na memória o sofrimento do pai ao cuidar de um dos 20 filhos, e a luta perdida para a praga, o bicudo do algodoeiro. Vieram as dívidas e o desgosto. “Mas os tempos estão melhorando novamente”, comenta satisfeito. Foi encorajado pelo amigo e presidente do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Quixadá (STTRQ), Eronilton Buriti, a desenvolver novas experiências numa pequena parte dos pouco mais de 10 hectares que possui.

O agricultor familiar recebeu visita e assistência de técnicos da Organização Não Governamental (ONG) Esplar. Ouviu tudo muito bem. Principalmente a promessa de compra do algodão que produzir e o preço garantido na compra. Mais que o dobro do que costumam pagar.

José Wilson confessa que ficou espantado, mas escondeu a euforia, pois, para ele, o visitante poderia se aproveitar do seu entusiasmo e “pechinchar”. O lavrador também recebeu manuais de orientação.

As informações estão guardadas com o filho José Sidnei, o caçula. Na família, é ele quem está na escola e sabe ler. Com dedicação, a ajuda dos técnicos e do resto da família está cumprindo à risca as orientações e colhendo os resultados.

Todas as manhãs, José Wilson cata as larvas do bicudo no algodoeiro. Junta os botões florados contaminados e queima tudo. Não vai dar tempo do besouro crescer, criar asas e se proliferar ainda mais. Ele aprendeu que para esse tipo de praga não há veneno
que acabe com os problemas ocasionados por eles.

Mas, com os cuidados que apreendeu, a plantação resiste. Agora não há mais broca nem queimada. Apenas apara o mato. Quando o inverno voltar vai encontrar mais um hectare a sua disposição. Vai ter milho, feijão, gergelim, melancia e algodão, tudo no mesmo lugar.

Dos ensinamentos e do hectare de algodão que plantou, compartilhado com outras culturas, já está encerrando a primeira colheita. Não foi das boas. A chuva não ajudou. Mas cerca de 20 arrobas já estão asseguradas. São quase R$ 500,00. Para quem tem tentado buscar amparo no Garantia Safra, mas não tem acesso ao benefício emergencial, a renda extra auxiliará no sustento da família até a próxima safra.

A expectativa dele, da esposa Maria do Carmo e dos filhos Sidnei e Sidirlei é de que, no próximo ano, a situação melhore ainda mais. Sentem isso no cheiro e no vigor da terra, que com generosidade lhes agracia com oferendas da natureza que se transformam em alimento e lucro. Observam isso todos os dias. Os pássaros estão voltando e a tristeza acinzentada de outrora indo embora.

Agora, o trabalhador rural não tem mais tempo pra prosa. Tem compromisso de entrega para amanhã. É hora de lavar os capuchos, as alvas plumas vegetais que já colheu, com xixi de vaca leiteira.

Fonte: Diário do Nordeste

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