DADOS DA CAIXA-PRETA ELIMINAM A TESE DA "PISTA MOLHADA"

A transcrição do diálogo entre os tripulantes do Airbus da TAM que se acidentou no dia 17 de julho, lida nesta quarta-feira na CPI dos Aeroportos, revela que as causas mais prováveis para a tragédia são as de falha humana somada a defeitos na aeronave. Mas só uma investigação mais detalhada poderá revelar a causa definitiva.Já está praticamente descartada, porém, a hipótese de problemas na pista de Congonhas terem influência nas causas do acidente.

A sessão plenária da CPI foi tumultuada desde o início, quando os parlamentares decidiram ouvir a transcrição da caixa-preta após a íntegra das informações ter vazado e sido publicada pelo jornal Folha de S.Paulo. O vazamento deve originar uma investigação na Câmara e na Aeronáutica para identificar os autores. Os parlamentares fizeram uma votação e decidiram ler o documento, pois não dava para divulgar o áudio da caixa-preta, que necessitava de software de decodificação que não está disponível, segundo o brigadeiro Jorge Kersul Filho, chefe do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa).

As gravações mostram os últimos diálogos entre os pilotos na cabine do Airbus. "Desacelera, desacelera, desacelera!", disse um deles. "Não dá, não dá, não dá", respondeu o outro. Por fim, a frase já conhecida: "Vira, vira, vira".

As informações constam de um CD-ROM com cerca de 60 arquivos de dados e áudio que foi enviado ontem à CPI dos Aeroportos na Câmara dos Deputados.

Quem fez a tradução da transcrição foi a deputada Luciana Genro (P-SOL-RS) e Rocha Loures (PMDB-PR) porque falam inglês fluente. Durante a leitura da caixa-preta, o plenário da CPI estava lotado de parlamentares, assessores, jornalistas e visitantes. Ao final da leitura, quando gritos indicavam o maior acidente da história da aviação, o plenário cheio fez silêncio por alguns segundos. Depois, o presidente da CPI pediu que a sessão voltasse a ser secreta.

Revelações "chocantes"

O relator da CPI do Apagão Marco Maia (PT-RS) avaliou que a transcrição dos diálogos da caixa-preta mostra que houve uma falha mecânica. No entanto, ponderou que ainda é prematuro afirmar que esse tenha sido o motivo do acidente.

"Vamos precisar ainda cruzar os dados da caixa-preta de voz com a caixa de dados para que possamos definir os motivos do acidente. Não dá agora para responsabilizar os pilotos ou ter pré-concebida a idéia de que houve um problema da aeronave. Está claro que os freios não funcionaram, mas o que precisamos saber é porque não funcionaram", disse.

Antes da leitura dos diálogos, ele advertiu os parlamentares de que as revelações eram chocantes. “ O quadro aqui é muito chocante, principalmente a parte final, quando os pilotos identificaram que já não tinham mais o que fazer”.

Maia defendeu que não só as empresas aéreas precisam ser investigadas, mas também os fabricantes dos aviões, no caso a Airbus, por conta de problemas semelhantes que teriam acontecido em outros acidente. “Esse problema já aconteceu em outros lugares”, disse em referência ao acidente com uma aeronave nas Filipinas.

Nesta quinta-feira (2), a CPI ouve os depoimentos do presidente da TAM e de um representante da Airbus.

Na terça-feira, 31 de julho, um deputado tucano da CPI já se preocupava com as reportagens que surgem na imprensa a partir de informações vazadas sobre a caixa-preta. A suspeita dele é de que as matérias podem ter sido alimentadas por informações da própria Airbus, que teve acesso à caixa-preta, e tem interesse em culpar o piloto, para livrar-se de ter de reembolsar a seguradora da TAM.

Oficiais da Aeronáutica, envolvidos na investigação, consideram, por enquanto, mais provável a falha mecânica. Acham difícil que um piloto com dez anos de experiência não tenha lembrado de um mecanismo básico de pouso, como a posição do manete -- espécie de comando da aeronave. Consideram, ainda, que um erro dessas proporções seria manifestado pelo piloto ou co-piloto, e estaria registrado nas gravações.

Mais tarde, em entrevista ao jornalista Paulo Henrique Amorim, Maia comentou o vazamento da informação sobre o conteúdo da caixa-preta. "Eu trabalhei até o dia de hoje sempre na perspectiva de que nós mantivéssemos o sigilo absoluto, que pudéssemos cruzar todos os dados e fazer a investigação andar até o momento em que nós tivéssemos uma certeza do que dê fato aconteceu nesse acidente. Mas infelizmente... Não partiu dessa CPI a informação, ela vazou e com certeza, se nós não trabalhássemos isso aqui publicamente ela estaria à noite ou durante o dia, chegando de forma atravessada, certamente, aos veículos da sociedade. Então eu acho que, apesar de ter a preocupação e o cuidado sempre de não fazer com que essas informações sejam veiculadas dessa forma, eu acho que não cabia a CPI um outro procedimento senão o de propiciar que todo mundo pudesse ter essas informações de forma coletiva e que a sociedade pudesse ter essas informações de forma aberta", disse Maia.

"Conclusões prematuras"

Na avaliação do vice-presidente da CPI do Apagão Aéreo na Câmara, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), a caixa-preta com os dados de vozes da cabine do Airbus da TAM mostram que as condições da pista do aeroporto de Congonhas não tiveram influência no acidente.

"O que me pareceu claro é que a pista não foi um fator preponderante, como se apregoou." O deputado declarou, no entanto, que ainda é cedo para apontar as causas da tragédia. "É muito prematura qualquer conclusão. Não dá para concluir no momento se houve erro mecânico nem falha humana."

O comandante da Aeronáutica, Juniti Saito, também cobrou cautela sobre as conclusões das investigações. A declaração foi dada no Palácio do Planalto, onde Saito participa, ao lado do ministro da Defesa, Nelson Jobim, da cerimônia de apresentação dos novos generais promovidos pela Marinha, Exército e Aeronáutica.

"É preciso ter paciência para esperar o relatório final", declarou Saito, em relação à investigações promovidas pelo Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa) sobre o acidente que matou 199 pessoas.

A imprensa, que tanto se empenhou em jogar na pista de Congonhas --e conquentemente no governo-- a "culpa" pelo acidente, ainda busca uma versão "comum" para interpretar os dados da caixa-preta. Enquanto isso, acionam seus articulistas para arrumar argumentos que sustentem o noticiário negativo sobre a crise aérea.

A jornalista Helena Chagas, do site Blog dos Blogs, registrou a precipitação da mídia e dos políticos. "Quando dizemos que o tempo da investigação não é o tempo dos políticos - e nem o da mídia - é por isso. A imputação de responsabilidades por um acidente aéreo que matou 200 é uma questão de tal seriedade, e tão grave, que não se deveria permitir qualquer conclusão até se ter certeza total", afirma a jornalista, que conclui afirmando que é preciso ir devagar com o andor. "Boa parte dos personagens dessa tragédia, inclusive os pilotos, está morta. Merecem uma investigação séria e isenta. E respeito".

Resta saber se o respeito será estendido também ao governo federal, alvo de uma virulenta saraivada de calúnias e difamações lançadas pela mídia e por setores da oposição que insistem em fazer uso político da tragédia.

Confira abaixo a transcrição da caixa-preta. As indicações "hot 1" e "hot 2" indicam as falas de piloto e co-piloto dentro do Airbus A320.

Hot 1: “Está ok? Tudo certo?”
Hot 2: “Ok” e pergunta onde irão pousar.
Hot 1: “Acabei de informar”
Hot 2: “Eu não ouvi, desculpe, ela falando.”
Hot 1: “Mas ela ouviu. Congonhas.”
Hot 2: “É Congonhas? Que bom. Ela deve ter ouvido, obrigado.”
Hot 1: “Lembre-se que temos apenas um reverso.”
Hot 2: “Sim, nós só temos o esquerdo.”

Airbus A320 reduz velocidade para aproximação e chama a torre na freqüência 127.15
Hot 1: “Boa tarde”
Hot 2: “Boa tarde”
Hot 1: “Torre de São Paulo, aqui é TAM 3054”
Torre: “TAM 3054 reduza a velocidade mínima para aproximação. O vento é norte 106.”
Hot 1: “Eu vou reportar quando estiver ok 35 esquerda.”
Torre: “Autorizado”

Hot 2: “Sistema de checagem final completo, a pista de chegada à vista, pousando”
Hot 1: “Pergunte à torre sobre as condições de chuva, da pista e se a pista está escorregadia”
Hot 2: Da cabine, pelo rádio: “TAM em aproximação final, a duas milhas de distância, poderia confirmar
as condições?”
Torre: “Está molhada, ainda está escorregadia. Eu reportarei que a 35 está liberada a 3054, já na final”
Torre: “ TAM 3054, 35 à esquerda, autorizado para pousar. A pista está molhada e escorregadia e o vento é 330 a 8 nós”
Hot 1: “330 a 8 é o vento”
Torre: “Checado, 3054”
Hot 1: “Pouso está liberado?”
Torre: “Pouso está liberado. Pouso verde, vôo manual”

Som do piloto automático desconectado
Hota 2: “Checado”
Som de três cliques indicando reversão para vôo manual
Som do movimento do acelerador
Som do aumento do ruído do motor
Som similar a um toque na pista

Hot 1: “Reverso número um apenas. Spoilers (freio) nada”
Hot 2: “Olhe isso”
Hot 1: “Desacelera, desacelera”
Hot 2: “Eu não consigo, eu não consigo. Oh, meu Deus, oh, meu Deus!”
Hot 2: “Vai, vai, vira, vira!”
Barulhos de batida

Torre: “Ah, não” (voz masculina)
Pausa nos barulhos de batida

Torre: “Som de gritos" (voz feminina)
Som de batida

Fonte: POrtal Vermelho - PCdoB

Comentários

Anônimo disse…
ERA TUDO QUE O PSDB E O DEM NÃO QUERIA.....INFELIZMENTE ALARDEARAM PARA TODOS OS CANTOS QUE O "GOVERNO MATOU 200 PESSOAS", COMO ESTAMPOU UM JORNAL DE SÃO PAULO, QUE CURIOSAMENTE É DE PROPRIEDADE DE UM EX-DEPUTADO TUCANO. ISSO DA A CRER A QUE NIVEL ESTA A OPOSIÇÃO NO BRASIL, BEM ABAIXO DA RAZOABILIDADE

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